sábado, 22 de agosto de 2015

O choro de África - Antonio Agostinho Neto

Antonio Agostinho Neto nasceu em Icola e Bengo, Angola. Estudou medicina em Portugal. Foi um dos dirigentes do movimento de independência de seu país.




O CHORO DE ÁFRICA



O choro durante séculos

nos seus olhos traidores pela servidão dos homens

no desejo alimentado entre ambições de lufadas românticas

nos batuques choro de África

nos sorrisos choro de África

nos sarcasmos no trabalho choro de África



Sempre o choro mesmo na vossa alegria imortal

meu irmão Nguxi e amigo Mussunda

no círculo das violências

mesmo na magia poderosa da terra

e da vida jorrante das fontes e de toda a parte e de todas as almas

e das hemorragias dos ritmos das feridas de África



e mesmo na morte do sangue ao contato com o chão

mesmo no florir aromatizado da floresta

mesmo na folha

no fruto

na agilidade da zebra

na secura do deserto

na harmonia das correntes ou no sossego dos lagos

mesmo na beleza do trabalho construtivo dos homens



o choro de séculos

inventado na servidão

em historias de dramas negros almas brancas preguiças

e espíritos infantis de África

as mentiras choros verdadeiros nas suas bocas



o choro de séculos

onde a verdade violentada se estiola no circulo de ferro

da desonesta forca

sacrificadora dos corpos cadaverizados

inimiga da vida



fechada em estreitos cérebros de maquinas de contar

na violência

na violência

na violência



O choro de África e' um sintoma



Nos temos em nossas mãos outras vidas e alegrias

desmentidas nos lamentos falsos de suas bocas - por nós!

E amor

e os olhos secos.

terça-feira, 11 de agosto de 2015

Amargos dormem tempos opostos - Abreu Paxe

Abreu Castelo Vieira dos Paxe, nasceu em 1969, no Colonato do Vale do Loge, Província do Uíge, filho de operário e de mãe doméstica. Venceu o concurso Um Poema para África em 2000.




amargos dormem tempos opostos



nas paisagens do espaço

afundava-se volumoso coração

no interior do quarto ilimitada natureza a sólida alma

próxima zona virgem a viagem das enguias

lugares de pequenas colinas ou seja:

sentem ondeadas brasas acesas noites também

permanecem transparentes

em forma de pêndulos as fragatas esperam

machucadas pêlos seus remos as algas refúgio:

atravessam os olhos cidades astrais com janelas descem

- velha sombra o basalto - lentas frestas

melhorando muito longe a idade do sol estas casas dos corpos

adoptando formas vermelhas

os pomares voltavam ardendo à teia todo tempo oposto

sábado, 8 de agosto de 2015

Mantenha - Alzira Cabral



Alzira Cabral nasceu em Bissau, 1955. Sua obra poética está dispersa em revistas e antologias.



MANTENHA



Filha do teu adultério

existo

queiras ou não com a mesma pele.

Exilada

sobrevivo contente

na terra dos sem cor.

Com a boa vontade que ganhei

das gentes daqui,

sem ressentimentos nem vergonha

cultivo a mentira da tua grandeza

no existir dos meus descendentes.



E mando mantenhas, oh terra

através dos meus poemas vermelhos:



A cor que me deste!

sábado, 1 de agosto de 2015

Mascarados - Cora Coralina

Mascarados


Saiu o Semeador a semear
Semeou o dia todo
e a noite o apanhou ainda
com as mãos cheias de sementes.
Ele semeava tranqüilo
sem pensar na colheita
porque muito tinha colhido
do que outros semearam.
Jovem, seja você esse semeador
Semeia com otimismo
Semeia com idealismo
as sementes vivas
da Paz e da Justiça.

Ter um amigo é maravilhoso - Sophia de Mello Breyner Andersen